Debate Interdisciplinar — Uma Nova Constituição para o Brasil

Debate Interdisciplinar — Uma Nova Constituição para o Brasil


A Constituição e a crise brasileira

por Modesto Carvalhosa

INTRODUÇÃO

Face à permanente crise política e à crescente perda da legitimidade dos poderes
constituídos, é necessário estudar as CAUSAS desses fenômenos recorrentes.

Seria essa constante crise de governabilidade fruto das más escolhas de nossos
governantes e representantes?

Ou se deve procurar a sua origem na ESTRUTURA do Estado, consubstanciada na Carta
de 1988?

Por outro lado, qual é a razão da crônica disfuncionalidade dosserviços públicos? Haveria
uma causa estrutural?

E qual a razão de nossa crescente retração econômica e exclusão social, que gera, todos
os anos, milhares de pessoas abaixo do nível de pobreza, por falta de oportunidades de
desenvolvimento pessoal, educacional, profissional ou cultural?

Há uma estrutura geradora dessa situação de persistente desagregação social, decadência
econômica e falta de perspectivas de melhoria de vida.

Em suma. Há ou não há um arcabouço estrutural que proporciona esse quadro contínuo
de exclusão, instabilidade, retrocesso e desesperança?

Trata-se apenas de uma ausência de lideranças, embora a crise de governabilidade já dure
mais de trinta anos?

Ao se debruçar sobre essas questões, verifica-se que as causas são nitidamente estruturais
e não conjunturais, tendo como fonte geradora a Constituição de 1988.

Por meio da Carta vigente constituiu-se um Estado hegemônico, que dividiu o país em
dois segmentos:

  1. de um lado, o setor público, formado pelos políticos profissionais e pelos
    servidores estáveis, que possuem todos os privilégios e não assumem nenhum
    risco ou responsabilidade no exercício de suas respectivas funções;
    e, de outro,
  2. o setor privado, que assume todos os riscos da atividade econômica e a quem, no
    entanto, é vedado o livre acesso à vida pública, em razão do monopólio dos
    partidos.

Dessa estrutura constitucional resulta a formação do sólido núcleo dos políticos
profissionais — unicamente voltados à sua permanência no poder mediante sucessivas
reeleições, que lhes garantem o gozo dos sempre crescentes privilégios e a apropriação
privada de recursos públicos, instituídos na Constituição de 1988.

Por sua vez, os onze milhões e meio de servidores públicos beneficiados pela estabilidade
plena e indiscriminada, também instituída pela Constituição de 1988, não têm nenhum
compromisso com a eficiência e a produtividade dos serviços públicos que devem prestar,
na medida em que não sofrem nenhum risco de perda de seus empregos estatais, que lhes
garantem automáticos e progressivos privilégios.

Esse contingente, que representa apenas 5,4% do povo brasileiro, absorve anualmente
mais de um trilhão de reais dos cofres públicos com suas folhas de pagamento dos ativos,
inativos e pensionistas.

Isso posto, o problema é estrutural e a solução também deve ser estrutural, visando:

  1. DESMONTAR o arcabouço constitucional que instituiu o profissionalismo
    político e;
  2. EXTINGUIR aquilo que se convencionou chamar de PROPRIEDADE
    ADMINISTRATIVA dos cargos públicos, estabelecendo-se o regime de
    isonomia entre os trabalhadores do setor público e privado.

Desse modo, uma nova constituição, de caráter principiológico e não analítico, teria dupla
finalidade:

  1. Eliminar os fatores que geram a hegemonia dos partidos, abrindo à cidadania o
    acesso à vida pública.
  2. Criar condições de risco profissional para os servidores do Estado, indispensável
    à eficiência e produtividade dos serviços públicos, induzindo a paridade dos
    salários entre os dois setores.

Essas medidas fundamentais de natureza política, de um lado, e administrativa, de outro,
ensejariam outras mudanças estruturais, com alterações (i) na cúpula do Poder Judiciário,
(ii) no orçamento, na (iii) ordem econômica, (iv) na imposição isonômica de tributos e na
(v) participação da sociedade civil na implementação de políticas de Estado.

Procura-se, com tais propostas constitucionais, uma mudança cultural na sociedade com
referência ao exercício da política, hoje vista pela cidadania como uma atividade espúria,
ocupada por pessoas de má-formação ética e despreparadas, sem nenhuma vinculação
com o interesse público e o bem comum.

As principais propostas estruturais de natureza constitucional podem ser assim resumidas:


NO PLANO POLÍTICO

  • Fim da reeleição.
  • Vedação aos parlamentares do exercício de cargos no Executivo.
  • Voto distrital puro para os deputados e vereadores, com o fim do voto
    proporcional.
  • Candidaturas independentes para todos os cargos eletivos (associações civis de
    natureza política).
  • Perda de mandato legislativo e de prefeitos por iniciativa dos eleitores (recall).
  • Eliminação do Fundo Partidário.
  • Eliminação do Fundo Eleitoral.
  • Eliminação das emendas parlamentares ao orçamento.
  • Eliminação dos cargos de provimento em comissão.
  • Reformas constitucionais mediante plebiscito.

NO PLANO DA BUROCRACIA

  • Regime de estabilidade restrito a específicas funções de Estado.
  • Regime previdenciário único.
  • Regime trabalhista único – CLT.
  • Isonomia tributária entre os setores público e privado.
  • Direito adquirido não pode prevalecer no âmbito do serviço público.
  • Eliminação dos adicionais e verbas indenizatórias.

NO PLANO DO COMBATE À CORRUPÇÃO E DESBUROCRATIZAÇÃO

  • Fim do foro privilegiado.
  • Seguro de obra nas empreitadas públicas, no valor de 100%.
  • Regime de declaração no lugar do regime de previa autorização.
  • Open government.

NO PLANO DO PODER JUDICIÁRIO

  • Trânsito em julgado em segundo grau.
  • Transformação do STF em Corte Constitucional — competência restrita à
    constitucionalidade das leis, dos atos normativos e dos atos administrativos.
  • Corte Constitucional de 11 membros, formada pelos ministros mais antigos dos
    tribunais superiores.
  • Mandato de 8 anos; também para os tribunais superiores.

QUANTO AO ORÇAMENTO

  • Todos os recursos serão discricionários e contingenciáveis, eliminando-se as
    despesas obrigatórias, vinculadas ou impositivas.
  • Vedada a criação de fundos orçamentários.
  • As despesas com folha de pagamento não podem ultrapassar um quarto das
    receitas orçamentárias.
  • Emendas do Congresso ao orçamento somente sob o aspecto da
    constitucionalidade e legalidade.

QUANTO AOS TRIBUTOS

  • Tributação com base no patrimônio e na renda tanto para atividades lucrativas
    como não lucrativas.
  • Eliminação das despesas tributarias para setores, empresas e entidades civis —
    isonomia e equidade de todos os contribuintes, pessoas físicas e jurídicas.
  • Ou seja: fim das isenções, anistias e subsídios, de qualquer natureza, para
    atividades lucrativas e não lucrativas

QUANTO À ORDEM ECONOMICA

  • Vedada a exploração de atividade empresarial pelo Estado.

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